A Litografia por Ana Monteiro...



Por Ana Monteiro... 

"Introdução

Relembrar da figura de Senefelder, é relembrar o inventor da litografia. Esta palavra deriva do grego Lithos (pedra) e graphein (escrita).
A historia do seu inventor é cheia de interesse humano e mostra como as dificuldades surgidas no caminho de um homem podem levá-lo a fazer descobertas fundamentais em sectores totalmente diversos. Senefelder tinha como ideia principal o de publicar as suas obras literárias, desprovidas aliás de valor. E para vencer as resistências, fez-se impressor de seus próprios escritos, não, porem, um impressor comum, que usasse os processos clássicos da tipografia porque não possuía dinheiro para tanto mas um impressor revolucionário, que desse modo, fundou a litografia.

História
Johann Aloys Senefelder nasceu em Praga, a 6 de Novembro de 1771. Filho mais velho de um actor que trabalhava no Teatro da Corte, em Munique, habituou-se a amar a vida artística e não foi sem relutância. Aos 15 anos, encaminhou-se para a Universidade de Ingolstadt, para estudar Direito. Constatando assim, que o seu pai desejava-lhe uma carreira bem diversa da sua. Após a morte de seu genitor, Johann Aloys não perdeu tempo e abandonou os estudos universitários, dedicando-se a escrever peças para o teatro. Este, era na verdade, o seu pendor e já havia feito algumas tentativas nesse sentido.
Em 1789 conseguiu êxito com uma banalíssima peça chamada "O Conhecedor de Mulheres", na qual também desempenhava um papel. Assim ele concluiu que seu destino não podia ser outro senão esse. Todavia, não conseguiu obter emprego no Teatro da Corte, de Munique, e teve de levar uma existência como actor ambulante. Em vez da glória, por ele sonhada, só encontrou humilhações na carreira abraçada. Resolveu abandonar o teatro e dedicar-se apenas à literatura. Para isso, era preciso tornar-se conhecido, e para ser conhecido, era preciso publicar as peças que já escrevera e que dormiam nas suas gavetas. Com muita dificuldade, conseguiu afinal um impressor, que lhe prometeu determinada soma pelos seus livros. Mas isto era a condição imposta pelo editor se a obra ficasse. Porém, a obra não ficou pronta no prazo combinado, mas somente quinze dias após. Com isso perdeu Senefelder praticamente todo o seu esforço, pois do editor apenas recebeu uma ínfima quantia, que mal pagava as despesas da impressão.
Meditando sobre sua infelicidade, Senefelder chegou à conclusão que só poderia editar suas próprias obras se possuísse uma tipografia própria. Coisa pequena, mas surgiu todavia a maior das dificuldades a esse objectivo: “onde achar o dinheiro necessário?” Reuniu tudo o que possuía, verificou que nem de longe poderia adquirir a modestíssima tipografia que aspirava. Essa impossibilidade, foi a causa directa da bendita descoberta do processo litográfico. Pôs-se Senefelder a fazer experiências, com o fim de encontrar um meio qualquer de imprimir, onde os custo teriam que ser mínimos. Começou com uma espécie de placa de estereotipia; fez uma pasta mole de argila, areia fina, farinha e carvão em pó e sobre ela comprimia letras e linhas inteiras, na esperança de reproduzir algo de semelhante às linhas que a tipografia compunha. Da chapa assim, grosseiramente obtida procurou tirar um molde com lacre, obtendo uma superfície, na qual, as letras apareciam em relevo. Quando passou, à operação de impressão, verificou, desapontado, que a chapa era quebradiça e se fazia em cacos à menor pressão. Não há duvida, que a ideia de Senefelder era verdadeiramente genial. Não desanimou. Deixando de lado esse processo, arranjou chapas de cobre e tentou escrever sobre elas, de trás para diante. Depois de ter coberto com cera ou com outro material mole, verificou que não era fácil escrever de trás para diante e em segundo lugar, o cobre era muito caro. Ainda por cima, e como se não bastasse, não havia meios de corrigir os erros acaso cometidos na escrita. Experimentou diversos materiais, mas nada saía perfeito. Posteriormente ocorreu a ideia de experimentar as pedras de Kehlheim, que se encontravam abundantemente nas redondezas. Essa pedra é muito branca e pode ser polida com facilidade. Além disso, era muito barata, condição essa que Senefelder mais contava. Continuando suas experiências, Senefelder preparou um verniz composto de cera, sabão e essência de terebintina. Espalhou-o sobre a pedra, como antes fizera sobre as chapas metálicas. Riscou a superfície de verniz com um estilete e com ácido corroeu a pedra que ficava por baixo. Depois conseguiu provas, aplicando uma tinta feita de óleo negro de Franc forte e óleo de tártaro. Limpou o excesso de tinta com água alcalinizada.

As provas que obteve, com esse processo, foram a principio muito grosseiras, em parte pela inabilidade de Senefelder como gravador e, por outro lado, pela porosidade das pedras, que retinham a tinta onde ela não deveria permanecer. Esses trabalhos de "impressão em pedra", como ele mesmo chamava, duraram de 1791 a 1796, e foram realizados por meio da mais extrema pobreza.
Em Julho de 1796, a mãe de Senefelder, pediu-lhe que fizesse o “rol” da a sua tinta de sabão, cera e carvão, o “rol” que deveria ser copiado mais tarde. E antes de apagar o curioso “rol”, lembrou-se de ver o que acontecia se cobrisse com acido a pedra escrita. Esperava que as letras, protegidas pela tinta, fossem poupadas e permanecessem, em relevo. Todavia teve êxito nesta experiência e desse modo nasceu a litografia. A escrita obtida estava longe de perfeita, mas era sem duvida a primeira realização do processo litográfico que naquele tempo recebeu o nome de impressão química. Assim, tão promissor lhe pareceu o processo, que resolveu dedicar-se exclusivamente a ele.
Como estava inteiramente sem recursos, para obter 200 “florins”, tentou substituir um amigo seu, num quartel. Mas, as autoridades militares rejeitaram-no, porque na Baviera ele era estrangeiro. Desesperado, vai de fracasso em fracasso, conhecendo tremendas desilusões.
Mas, jamais abandonando sua ideia litográfica, até que entrou em contacto com Gleissener, compositor e membro da banda do Eleitor da Saxonia. Este compositor, assim que viu as provas apresentadas por Senefelder, ofereceu-lhe parceria, nascendo finalmente a primeira oficina litográfica do mundo, em 1796. A litografia passou da fase puramente experimental para a industrial, como processo de reprodução de musicas. Pela primeira vez, depois da sua insignificante peça "O Conhecedor de Mulheres", finalmente conhecia êxito o pobre Senefelder. Dedicou-se a ampliar o negocio, criando uma empresa maior do que até a contestar a originalidade de sua descoberta. Pois esse alguém apareceu. Quase ao mesmo tempo que ele, um inglês, Schmidt, professor do Colégio Militar Real, fazia experiências de gravação em relevo sobre pedra. O qual acabou por reclamar para si a patente, que logicamente cabia ao infeliz Aloys. Sua reclamação, sabe-se hoje, que era inteiramente infundada e a gloria da descoberta da litografia e integral, para Senefelder. Nessa altura encontrou um bom patrono, o reverendo Steiner, que tinha uma importante função oficial. Prosseguindo suas actividades, Senefelder, cuja escrita não era muito boa, contratou uma espécie de letrista, para fazer, em papel, a escrita a ser impressa. Essa escrita era então transferida do papel para a pedra, descobrindo-se desse modo a litografia de transferência ou autografia, uma das mais interessantes descobertas desse homem. O fim da vida de Senefelder, é bem diverso. Não lhe faltou o reconhecimento de seus contemporâneos assim, como não lhe faltaram honrarias e retribuições. Foi nesse ponto, mais feliz do que, Guttenberg. Se tivesse hábitos de economia, poderia ter deixado grande fortuna. À sua memória levantou-se um mausoléu, e este por mera coincidência, foi feito de pedra de Kehlheim.
Em 1818 Senefelder publicou um manual de litografia, transmitindo os seus conhecimentos que tão duramente obtivera. Esse livro foi dedicado aos seus Seguidores.

Com o passar do tempo, esta técnica teve, grande expansão a nível artístico desde o século XIX.
As primeiras litografias artísticas apareceram em Londres, apesar de que em França, este processo foi largamente utilizado por diferentes artistas destacando-se: Miró, Picasso, Kandinsky, Chagal, Goya, Delacroix, Daumier, Manet, Degas, Odillon, Redon, Toulouse Lautrec, Bommard.
Em 1824, foi fundada em Portugal, a primeira oficina em Lisboa, por decreto de D. João VI denominado por: “Officina Régia Littográfica”.
Joaquim Vilanova, Domingos Sequeira, Luiz Albuquerque, São Cipriano Dourado, Barradas e Júlio Pomar. Alguns nomes, portugueses, que tornaram a litografia numa técnica mais eficaz no nosso país.
Porém, este processo tecnológico teve uma expansão bastante lenta, visto que, sem oficinas, ou escolas, os artistas não podiam ter acesso à gravura com um intuito criativo.
A primeira oficina em Portugal que empregou as pedras de origem portuguesa foi a "Oficina Santos". Esta oficina substituíu as pedras vindouras da Alemanha pelas portuguesas originado assim a redução de custos.
No entanto, os trabalhos que requerem grande delicadeza eram desenhados. O aparecimento da Cooperativa de Gravadopres, em 1956, a litografia artística passa a ter um incremento superior. Este facto, aconteceu devido ao grupo de artistas terem efectuado várias experiências nas oficinas desta Cooperativa, levando a outros artistas, a praticarem esta modalidade artística.
Assim, surge as primeiras obras efectuadas por: Jorge Barradas, Júlio Pomar, Alice Jorge, Cipriano Dourado, entre outros.
Com o aperfeiçoamento e com a continuação destes métodos avançou-se para a introdução de uma e mais cores, dando à litografia, valores mais glorificantes.
Desta nova situação surge novos litografos destacando-se Manuel Cargaleiro, António Sena, Eduardo Nery.


Técnica da litografia
A litografia surge da incompatibilidade entre duas substâncias da gordura e da água que são aplicados numa base. Nesta base, de pedra, é desenhada com a ajuda de tinta ou de lápis litográfico à base de gordura. Seguidamente é acidulada, ou seja, é coberto com uma solução de goma arábica e ácido nítrico.
A adição de goma arábica, contribui para que o desenho (gordura) se fixe. Seguidamente, nas zonas não desenhadas, isto é, não engorduradas ficam aptas a rejeitar a gordura da tinta de imprimir devido à absorção da pedra que constantemente tem que ser humedecida durante a fase de impressão.

Esta técnica, deu origem em 1905 ao processo de offset, descoberta por Ira Rubel, baseado no mesmo princípio mas, a base, era substituída por chapas de zinco e de alumínio. Este princípio, já tinha sido outrora experimentado só que efectivamente não resultara devido aos conhecimentos da época, quer técnicos quer mecânicos, os quais, não permitiam obter resultados positivos.
Como em qualquer processo de gravura, na litografia, também tem que se desenhar com a imagem invertida.
Poder-se-à utilizar papel vegetal para transpor as linhas gerais do desenho.
Muitos artistas, optam por desenhar directamente na pedra, e outros recorrem a outros meios para obter resultados novos ou inovadores.

Nesta técnica pode-se requerer:
1) Ao lápis litográfico que é composto por cera, sabão, negro de fumo e goma laca (esta última componente é que determina o grau de dureza) ;
2) À tinta litográfica que se apresenta sob a forma líquida designada por “Tushe”. Esta pode-se diluir em água, terebintina rectificada, benzina ou álcool. Também existe uma forma sólida em barra, que posteriormente, se pode diluir em água destilada para a obtenção de água das mais complexas;
3) Os aparos de ponta cilíndrica servem para trabalhar na pedra de 5 cm onde se pode aplicar muita pressão. Através deste meio de escavação obtém-se traços desde os cinzas aos brancos;
4) Com os pincéis obtêm-se zonas de cor lisa e também efeitos de águada. As trinchas são utilizadas para cobrir grandes zonas e permitem obter efeitos de pulverização. Touçus de Lautrec nas suas litografias usou constantemente este processo.

Inicialmente procede-se à acidulação da pedra consistindo pela junção de 3 misturas com produtos químicos sendo eles: a goma arábica e ácido nítrico. Após as misturas estarem realizadas passa-se para a aplicação na pedra por meio de pinceladas resultando uma efervescência branca. A temperatura ambiental também vai interferir, ou seja, quando a temperatura é elevada torna-se seca, a pedra e em oposto torna-se húmida.

É necessário: Resina, Talco, Goma arábica diluída, Acido nítrico, Esponja, Asafalto líquido (Betume da Judeia) e Terbentina. Seguidamente procede-se a um método baseado em diferentes etapas ou seja:

“1-Desenha-se na pedra com lápis litográfico ou tinta litográfica;
2-Seca-se (no caso de ter utilizado tinta);
3-Com o algodão espalha-se na sua superfície resina moída muito fina;
4-Repete-se a operação com talco;
5-Faz-se uma preparação de goma arábica filtrada com a consistência de um xarope (14 º da escala de Baumé);
6-Junta-se à goma algumas gotas de ácido nítrico, em média cinco ou oito gotas de ácido nítrico, para um copo de goma arábica;
7-Ensaia-se num canto da pedra ou noutra pedra, que se guarda para ensaios (esta solução sob a pedra apresenta uma efervescência branca);
8-Espalha-se sob a superfície da pedra incluindo os bordos;
9-Deixa-se actuar mais ou menos durante um minuto e retira-se o excesso acetinado ou alisando a pedra com um pano ou esponja;
10-O preparado deve permanecer na pedra, pelo menos durante três horas;
11-Lava-se em seguida com água;
12-Com goma pura, com a consistência de xarope, acetina-se até secar;
13-Limpa-se a imagem com asfalto e terbentina;
14-Com um pano fino acetina-se o asfalto até secar enquanto se prepara o rolo com a tinta;
15-Lava-se com água até retirar todos os vestígios de terbentina e atinta-se conservando a pedra humedecida.”

Pedras
A escolha das pedras é vital para o fim a que se destina. Contudo, os xistos calcários vindouros da Solnhofen na Alemanha, foram os primeiros a serem usados por Senefelder devido às suas características de porosidade e dureza.
Podemos encontrar nas pedras cores, tamanhos e espessuras, às quais, lhes são atribuídas características particulares.
As pedras que apresentam uma cor azulada ou cinza escuro até aos cinzas claros são consideradas duras. Porém, as de tons amarelos são menos duras e desgastam-se com menos facilidade. Estas não permitem trabalhos de grande rigor e delicadeza mas, são as ideais para fundos lisos.
A pedra ideal é a de tom cinza médio. Algumas devem ser evitadas, como por exemplo, as que apresentam manchas de minerais devido à sua composição porque são procedentes de rochas sedimentares de origem orgânica. Devido a essas marcas na sua textura, veios grânulos de diferentes cores, etc... podem causar problemas durante a fase de impressão.
Os tamanhos e a espessura são variáveis. Estas partem-se facilmente devido à sua composição em camadas.
Para rentabilizar a perda, temos que proceder à fase de limpeza. Considerando os 80 e 100 (grossos), 120 e 180 (médio) e 220 (fino) e, o Carbundum são as soluções químicas para a limpeza das pedras.

Conclusão
Esta técnica de gravura, plana é relativamente recente, à qual, Senefelder definiu como “novo processo de gravar quimicamente”.
Passado algum tempo, este termo, deixou de ser adoptado passando-se a designar por Litografia.
Através desta técnica inúmeros artistas usaram-na e continuam a usar, porque através dela permite representar e mostrar a todos nós, as suas vertentes artística."

Bibliografia
*ARNOLD; Matthias, Henri de Touluse-Lautrec1864-1901-O Teatro da Vida; Benedikt Benedikt
*DUCHTING; Hajo, Wassily Kandinsky- 1866-1944-Revolução da Pintura; Benedikt Benedikt
*Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura; nº12; Editorial Verbo; Lisboa
*JORGE, Alice,GABRIEL,Maria; Técnica da Gravura Artística; Livros Horizonte...Créditos Ana Monteiro

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